O que um coronel da ditadura faz no comando da CBF?

Oficial da Aeronáutica aposentado, comandante da Polícia Militar e prefeito biônico no Pará, o coronel Antônio Carlos Nunes de Lima, 77, preside a CBF sem ter tido qualquer relação com o futebol.

Colocado no comando da entidade por Marco Polo Del Nero em dezembro de 2015, para evitar que o protegido de José Maria Marin, Delfim Peixoto assumisse a vaga, Nunes permanecerá no cargo até abril de 2019.

Em comum com os antecessores, incluindo Ricardo Teixeira, o coronel Nunes nada tem a ver com futebol. Trata-se apenas de um substituto para garantir a continuidade do controle mafioso sobre a Confederação Brasileira de Futebol.

Nunes foi homem de confiança do regime militar. Recebe até hoje um soldo mensal de quase R$15 mil da Força Aérea Brasileira (FAB) como anistiado por “vítima de ato de exceção de motivação política”. Conforme decisão do Ministério da Justiça, do então ministro Márcio Thomaz Bastos, em 2003, recebeu uma indenização retroativa de mais de R$243 mil.

A reportagem de Lúcio de Casto, na agência Pública, oferece um panorama da carreira do militar-cartola.

Do posto de cabo na Força Aérea ao de coronel comandante da Polícia Militar do Pará, onde nasceu, sua carreira iniciada em 1957 se encerrou em 1991. Atuou nas Forças Armadas por nove anos, até ser dispensado por tempo de serviço, e apenas nove dias depois de ter dado baixa foi admitido na Polícia Militar onde progrediu sem entraves, Nunes avançou de capitão a major da PM na repressão à guerrilha do Araguaia.

No Estado, foi tesoureiro do Gabinete Militar, em 1969, enquanto ainda era primeiro-tenente. Em 71, ainda como oficial subalterno, foi nomeado Comandante da Companhia Independente de Santarém (hoje 3º Batalhão da PM). De 75 a 77, foi ajudante de ordens do governador Aloísio da Costa Chaves, da ARENA. Em seguida, como major, foi nomeado pelo regime prefeito de sua cidade natal, Monte Alegre, até 1980.

Na década de 80, evoluiu na carreira militar de tentente-coronel em 1981 a coronel da PM em 1990. Ocupou 11 cargos na hierarquia do Estado-Maio Geral.

Como disse o professor da Universidade do Estado do Pará, Airton dos Reis Pereira, citado por Castro, “A Polícia Militar do Pará tem um histórico de violência e impunidade, envolvimento de seus membros com a pistolagem e repressão aos movimentos sociais e populares e muitas vezes assassinato dos integrantes. No período da repressão à guerrilha do Araguaia, a PM auxilia as tropas de repressão do Exército com blitze na Transamazônica e na repressão aos trabalhadores e moradores das redondezas, líderes sindicais e religiosos. Essa repressão da PM segue nos castanhais, fazendas, onde muitas vezes são contratados, no Bico do Papagaio. São inúmeros eventos. Creio ser impossível alguém da hierarquia da PM do Pará ter passado imune a tudo isso naquele período”.

Sob seu comando, e de seus ilustres antecessores, a CBF está envolvida em todo tipo de maracutaia, do desvio de verbas privadas e públicas por meio de agências de viagem à interferência dos patrocinadores e investigadores no esporte.

Recentemente, Nunes quebrou um acordo na Conmebol na escolha da sede da Copa de 2026, votando no Marrocos contra a candidatura de EUA, México e Canadá. Na Rússia, protagonizou mais de uma gafe, chamou o Mar Negro de Mar Vermelho e esqueceu que o Brasil venceu a Copa de 1958, na Suécia, ao dizer que a vitória na Rússia faria da Seleção a primeira sul-americana a vencer um mundial na Europa. Não apenas é uma figura folclórica, mas uma demonstração do controle de verdadeiros inimigos do futebol sobre o aparato que é muito mais prejudicial ao esporte do que qualquer jogador ou técnico incompetente.

Para quem não acredita em conspirações e acusa quem as denuncia, a presidência da CBF é evidência clara de que o esporte mais querido do País é controlado e submetido por forças políticas de direita, e não pelo amor à bola.