Sentido! Manuela D’Ávila vai até general Villa Bôas apresentar seu programa

Na tarde da última terça (17), a deputada estadual e pré-candidata à Presidência da República esteve no gabinete do comandante geral do Exército, General Villas Boas que, segundo ela, “está recebendo os candidatos à presidência da República”.

Em sua página no Facebook, Manuela acrescentou, candidamente:

Foi uma ótima conversa, na qual reafirmei a convicção do PCdoB de que as eleições debatam um novo projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho, democracia e defesa da soberania nacional.

Naturalmente, o episódio despertou polêmica. Por que o chefe das Forças Armadas está recebendo os (pré) candidatos à presidência da República, com que finalidade? Por que Manuela D’Ávila e o PCdoB – supostamente de esquerda – aceitaram o convite para um encontro a portas fechadas com um dos setores mais reacionários do país e ainda divulgaram-no como algo trivial, como se fosse um encontro entre aliados políticos?

Convém primeiramente lembrar que não há golpe de Estado sem o apoio militar. Se Dilma Rousseff foi forçada a sair do poder, isso ocorreu sem resistência também porque as Forças Armadas se colocaram ao lado dos golpistas, e porque nelas não havia um setor organizado de defesa dos direitos democráticos da população.

Em setembro do ano passado, o general Hamilton Mourão, do alto comando do Exército, anunciou publicamente numa palestra na maçonaria que as Forças Armadas estariam trabalhando com “aproximações sucessivas” rumo a um golpe militar no Brasil. Villas Boas, que deu entrevistas nos dias seguintes, nem desmentiu Mourão nem o puniu. Mourão – admirador assumido do torturador Carlos Brilhante Ustra – se aposentaria em fevereiro no mesmo cargo em que estava anteriormente, na Secretaria de Economia e Finanças do Exército.

Na verdade, os militares vêm seguindo à risca o plano de “aproximações sucessivas” rumo ao golpe. Realizaram manobras em conjunto com os exércitos do Peru, Colômbia, Bolívia e Estados Unidos na Amazônia em novembro. Colocaram sob intervenção militar os estados do Rio Grande do Norte em dezembro e Rio de Janeiro em fevereiro. Cada vez mais, o general Sérgio Etchegoyen – ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional – tem participado da definição dos rumos da política nacional, em que Michel Temer figura  como eterno coadjuvante. O general indicou, por exemplo, o chefe da Polícia Federal – Rogério Galloro – e o ministro da Defesa – Joaquim Silva e Luna.

Villas Boas evidentemente participou de todas essas decisões nos bastidores, embora mantendo a pose “moderada” que sua idade e permanência no cargo enseja. O comandante geral do Exército porém revelaria sua verdadeira face às vésperas do julgamento do habeas corpus preventivo de Lula pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 3 de abril. A Rede Globo anunciaria em tom solene ao final do Jornal Nacional uma mensagem que o general acabara de disparar no Twitter:

Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais.

Era uma clara ameaça de golpe militar endereçada aos ministros do STF caso garantissem a liberdade de Luiz Inácio Lula da Silva. O Supremo cedeu à pressão militar, negou o habeas corpus e, por decreto de Sérgio Moro – o Mazzaropi da Odebrecht – Lula seria encarcerado numa masmorra em Curitiba na noite do dia 7 de abril, onde permanece até hoje.

Depois dessa ação, o general Villas Boas passou a convocar os pré-candidatos à Presidência da República a seu gabinete. Segundo o site do Ministério da Defesa, o comandante teria recebido Jair Bolsonaro (PSL), Álvaro Dias (Podemos), Geraldo Alckmin (PSDB), Marina Silva (Rede), Fernando Haddad (PT), Ciro Steinbutre Gomes (PDT). Não se tem notícia do encontro com Haddad, que teria sido escalado via Fernando Henrique Cardoso, mas o site divulga fotos de Villas Boas com Alckmin, Bolsonaro, Ciro e Marina.

O general alega que a pauta das conversas seria centrada em torno a quatro aspectos: “uma definição dos rumos e do papel que nós queremos que nosso país desempenhe no contexto regional e no contexto mundial”; ressaltar o papel da defesa nacional frente à ausência de percepção de “ameaças, nem à soberania nem à integridade nacional”; afirmar a importância da segurança pública; e reivindicar orçamento para as Forças Armadas.

Sabe-se porém que o nacionalismo dos militares é mera fachada. A ditadura militar foi financiada e apoiada pelo governo dos Estados Unidos e levou o país a um dos períodos de maior entreguismo de nossa economia, em que a estatização – supostamente nacionalista – era na verdade uma maneira de assegurar o monopólio imperialista em diversos setores.

É claro que, além de sabatinar os candidatos, os militares têm em Bolsonaro um virtual representante das Forças Armadas na corrida presidencial. Há porém o desconforto dos generais em subordinar-se a um mero capitão do exército (sabidamente um mau soldado), e cogita-se que ninguém menos que o próprio general Mourão concorra à Vice-Presidência ou à própria Presidência na chapa do ultradireitista Levy Fidélix (PRTB).

No âmbito de seu partido, a visita de Manu ao general não poderia ter vindo em hora mais crítica. Inicialmente lançada como ponte capaz de ligar o sempre fisiologista PCdoB à candidatura de Ciro Gomes, a pré-candidata vem sendo o pivô de uma crise interna no Partido quanto ao abandono da candidatura de Lula à presidência. Acendendo uma vela para cada santo, ela ora sobe nos palanques de atos contra a prisão de Lula, ora dá as mãos ao golpista Paulinho da Força (Solidariedade) em busca de apoio na Força Sindical. De Força em Força, natural ter atendido a um convite das Forças Armadas. Seu partido, diz-se, trava boas relações com a caserna desde que Aldo Rebelo (Solidariedade), então nos quadros do PCdoB, foi ministro da defesa no governo Dilma – justamente o último, antes do impeachment.

Ironicamente, o achaque das Forças Armadas pode ter entornado o caldo na fervura dos adeptos do Plano B à candidatura de Lula dentro do PCdoB. Na quarta, viriam à tona os rumores de que Manuela poderia dar um sentido a sua campanha, anunciando na quinta sua candidatura à Vice-Presidência numa eventual chapa com o PT.

Assim como a base popular do PT, a base do PCdoB parece esperar de suas lideranças uma postura real de combate ao golpe de Estado em curso, que vá além do palavrório de palanque eleitoral. É necessário mobilizar a população e ir às ruas para exigir dos golpistas a liberdade para Lula e sua candidatura à Presidência da República. Sem uma mudança real na correlação de forças políticas abrem-se as portas para uma ditadura das Forças Armadas.